CESÁRIO VERDE
(variante sem burguesas)
Naquele piquenique de deusas, serviram
ambrósia e sanduíches de cisne, com
molho de via láctea a mistura. Vénus,
de véu na cabeça, desatou-o; e os seus
cabelos derramaram-se pelo copo, para
que Vulcano se engasgasse, ao beber,
e Marte lhe batesse nas costas, fazendo
inchar mais ainda a sua corcunda. Mas
quando a pálida Diana, num crescente
de lua, tirou a saia, e os sátiros saíram
de dentro das pregas, todos olharam
para o lado, e foi a coisa mais bela da
merenda: os seus seios soltos, e os doces
melões, servidos na bandeja do céu.
Nuno Júdice, in A Matéria do Poema
De Tarde
Naquele "pic-nic" de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o Sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão-de-ló molhado em malvasia.
Mas, todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro de papoulas!
Cesário Verde
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