Apontas
para o rosto sarcástico do sol de Inverno
E disparas. Há tantos meses que não chove –
reparaste?
É o próprio céu a desistir de ti. E mesmo assim tu
disparas, só sabes disparar.
Estás enganada, Europa. Envelheceste mal e perdeste
a humildade.
Não é contra o sarcasmo que disparas, não é contra o
Inverno,
Nem sequer contra o insólito, contra o desespero.
Tu disparas contra a luz.
Podes atirar-nos tudo à cara, Europa: bombas,
palavras, relatórios de contas.
Podes até atirar-nos à cara um deputado, uma
cimeira.
Mas os teus filhos não querem gravatas. Os teus
filhos querem paz.
Os teus filhos não querem que lhes dês a sopa. Os
teus filhos querem trabalhar.
Há tantos meses que não chove – reparaste?
A terra está seca. Nem abraçados à terra conseguimos
dormir.
Enquanto te escrevo, tu continuas a fazer contas,
Europa.
Quem deve. Quem empresta. Quem paga.
Mas os teus filhos têm fome, têm sono. Os teus
filhos têm medo do escuro.
Os teus filhos precisam que lhes cantes uma canção,
que os vás adormecer.
Eu acreditei em ti e tu roubaste-me o futuro e o dos
meus irmãos.
Se estamos calados, Europa, é apenas porque,
contrários ao teu gesto,
Nós não queremos disparar.
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