Ainda a Aparição.


No cap. I., Alberto começa por se identificar com:


- Profissão - “Sou professor de liceu” (pg.13). -

- Alcunha - “O monge sou eu” (pg. 17).

- Nome próprio - “O Alberto sou eu” (pg.20).



Tudo isto são elementos exteriores, são formas de sociabilização. Referem-se não apenas ao "eu", mas à relação eu / sociedade. Isto é, são convenções que facilitam a aprendizagem do social.


Profissão : estatuto social

Alcunha : forma de os outros o verem “ o monge”

nome próprio: é um rótulo, uma forma de se manifestar.


“não sei que pacto se estabelece entre a pessoa que somos e o nome que nos deram : o nome como o corpo, é nós também ” (pg. 20)


No cap. II, Alberto, confrontado com a morte do pai relembra a questão essencial que o persegue desde a infância.

“Quem sou eu ?” ( pg. 25)

A resposta que lhe é vaga, não o conseguindo satisfazer cabalmente. Alberto tem consciência de que é mais do que um mero ser vivo que pensa, vive e há-de morrer. A inquietação existencial de Alberto caminha progressivamente do exterior para o interior.

No cap. III, Alberto diz-se um indizível equilíbrio interior.

Estamos perante um paradoxo: ele diz que é o que não pode ser dito. Depois de Alberto ter concluído que é uma entidade única e irrepetível toma consciência da morte como limite. A morte corresponde a uma “desaparição” (pg. 51) Na filosofia cristã o homem tem consciência que é um ser finito perante a infinitude divina.

Em Aparição proclama-se morte de Deus (pg. 46). Deus já não explica. O ser depara-se com o Nada.


“Ora este eu é para morrer” (...) Mas como é possível? Agora eu sou essa intimidade, agora que sou o seu espírito, a sua evidência.”


No início do cap. IV , Alberto encontra um novo problema: “justificar a vida em face da inverosimilhança da morte” (pg. 49). Por isso regressa aos primórdios do homem – procura a “verdade primitiva” (pg. 49) e conclui que ele não é mais do que o resultado de “biliões e biliões de acasos” (pg. 50). A morte é aqui um paradoxo, um absurdo face à existência. Só temos consciência do “eu” no instante da morte.

No cap. VI existe, pela primeira vez, o confronto entre a aparição de si a si mesmo.

Depois da aparição de si, surge outro problema: como comunicar aos outros a sua descoberta.


No epílogo, Alberto diz :

“Casei, adoeci, retirei-me do ensino” mas o essencial permanece inalterável: cada instante continua único e irrepetível. É dada mais importância não ao ser mas ao estar sendo. Ou seja ao instante.

O problema do ser também se coloca ao nível da palavra.

“E, todavia como é difícil explicar-me! Há no homem o dom perverso da banalização. Estamos condenados a pensar com palavras, a sentir com palavras, se queremos pelo menos que os outros sintam connosco. Mas as palavras são pedras.” Pg. 44

A língua condiciona, sendo simultaneamente criadora e veículo de cultura (actividade cognoscitiva e manifestativa). A língua corresponde a uma determinada apreensão da realidade (sistema modelizante primário) , não traduzindo contudo automática e fielmente o que queremos exprimir.

A linguagem faz com que o homem seja mais do que um “ser para si” , ajuda-o a ser um “ser para os outros”. O problema da palavra está presente em Aparição na medida em que Alberto se debate com o problema da opacidade da linguagem , com a dificuldade em adequar o que quer dizer às palavras que existem. Daí que o “eu” seja um “indizível equilíbrio” .



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