Tinha um cravo no meu balcão;
veio um rapaz e pediu-mo
-
- mãe, dou-lho ou não?
Sentada, bordava um lenço de mão;
veio um rapaz e pediu-mo
-
- mãe, dou-lho ou não?
Dei um cravo e dei um lenço,
só não dei o coração;
mas se o rapaz mo pedir
-- mãe, dou-lho ou não?
(Eugénio de Andrade - Poesia e Prosa)
Com efeito, esta composição poética tem marcas que nos remetem para a tradição da lírica medieval.
Eugénio de Andrade, poeta contemporâneo português, recorre aos artifícios das cantigas de amigo para recriar uma pequena história de amor.
O eco das cantigas de amigo está presente na construção paralelística e na presença da mãe. Tradicionalmente, a mãe funciona como confidente e adjuvante; aqui é a voz que ouve os anseios do sujeito de enunciação.
Como nas cantigas de amigo há um refrão, neste caso um refrão que implica uma escolha. A “amiga” é sujeita a uma série de pedidos: cravo, lenço, coração. Deu o cravo, símbolo quiçá da liberdade, deu o lenço bordado e, agora, tem dúvidas sobre se dará ou não o o coração.
Como nas cantigas de amigo, sentimos a dúvida, a ansiedade, o despertar dos amores. Isto prova, que o tema amoroso, passem os séculos que passarem, é omnipresente.
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